segunda-feira, dezembro 31, 2007

Canção para Ilhabela



A Ilha é a mística terra
A Ilha é a rainha do Mar
A Ilha é o sumo e o néctar
A Ilha é a nascente solar
A Ilha é da cor do poente
A Ilha é a estrela e o luar
A Ilha é o pecado latente
Na pele das moças de lá

A Ilha é o navio zarpando
(a alma do bom pescador)
A Ilha é o barco ancorando
A Ilha é cenário de amor
A Ilha é a flor e a semente
A Ilha é um caso indecente
que a gente não quer esquecer...

A Ilha é Paixão, Carnaval
A Ilha é Quaresma e São João
A Ilha é uma linda oração
(um rito pra não se passar)
A Ilha é as quatro estações
A Ilha é romance sem fim
A Ilha é um ciclo completo
A Ilha é o que está em mim

A Ilha é silêncio e tumulto
A Ilha é o verde brotando
A Ilha é naufrágio e piratas,
Corsários, bandeiras, fragatas
A Ilha é um poço de histórias
A Ilha é a trilha, é a lama
A Ilha é roteiro sem drama
A Ilha é um só festejar

A Ilha é o refúgio do artista
A Ilha é poesia, é canção
A Ilha é o texto e a tela
O sal da minha criação
A Ilha é o tema e verso
Roteiro, jornada, trajeto
A Ilha é todo o universo
Um templo pro meu bem-querer

A Ilha é o meu paraíso
A Ilha é tudo o que preciso
Futuro a me acalentar
A Ilha é o Norte apontando
Desenho que eu vou esboçando
A Ilha é meu porto, meu lar...
A Ilha é, assim, um tesouro
Um beijo molhado e roubado
Que espero, ainda, ganhar.


Goimar Dantas
IlhaBela, Litoral Norte de São Paulo
Em 15-11-07

segunda-feira, dezembro 24, 2007

O cão anda à luz




Os verdes dos olhos de lobo
O verde por trás da lembrança
Planície distante da infância
Afeto eterno a me saudar

E quando lembro o seu carinho
A sua alegria em nos ver!
Pergunto a mim mesma (e ao destino)
Por onde fomos nos perder?

Veloz, corria como vento
E era valente e bonito
A fera de jeito bendito
Guardando, atento, o nosso lar...

Mas ao morrer seu jovem dono,
(Meu pai e nobre cavaleiro)
Partiu, também, seu escudeiro
Quem sabe no rastro da luz...

Quem sabe na busca do anjo...
Quem sabe na curva das horas
Os dois caminhando em silêncio...
Os dois brincando à beira-mar.

Quem sabe o pai esteja lendo
E o nosso cãozinho, correndo
À sua volta, sem parar...
Quem sabe surjam nos meus sonhos
Ou mesmo num texto tristonho
Que eu escreva ao invés de chorar

Pra desabafar neste tempo
Distante daquele outro Tempo
Que insiste em nunca mais voltar...

(Para o meu primeiro e único cãozinho, Freeway - que eu pensava dividir com minha irmã... Mas que, na verdade, sempre pertenceu ao meu pai... Aqui vai a minha saudade e a minha homenagem tardia mas, sincera, nessa véspera de Natal, 22 anos depois).

Goimar Dantas
Santa Rita do Sapucaí
Sul de Minas Gerais
Em 24-12-07

quarta-feira, dezembro 19, 2007

Yin e Yang



Todo mundo é luz e sombra
Todo mundo é paz e guerra
Todo mundo é frio de Inverno
E apogeu da Primavera
Todo mundo é o silêncio
Todo mundo é gritaria
Todo mundo é meia-noite
Todo mundo é meio-dia
Todo mundo é o princípio
Todo mundo é o final
Todo mundo é brincadeira
Todo mundo é ritual
Todo mundo é obra-prima
E todo mundo é esboço
Todo mundo é a vitória
Todo mundo é fim do poço
Todo mundo é água limpa
E todo mundo é a lama
E todo mundo é a cinza
E todo mundo é a chama
Todo mundo é bem-vindo
Todo mundo é desprezado
Todo mundo é meio Deus
Todo mundo é o diabo!
Todo mundo é mundo inteiro
Todo mundo é o seu quintal
Todo mundo é a cigarra
(em tempo de Carnaval)
Todo mundo é a formiga
(protegendo o seu quinhão)
Todo mundo é a enxurrada
Todo mundo é o Sertão
Todo mundo é castidade
Todo mundo é tentação
Todo mundo é lua plena
Todo mundo é insolação
Nós somos mata cerrada
Nós somos devastação...

E nessa mata somos índio
E um bando de português
Todo mundo aqui é negro
Todo mundo é holandês
Todo mundo é salvação
Todo mundo é sua cruz
Todo mundo é passageiro
E todo mundo conduz

Todo mundo é Zona Norte
Todo mundo é Zona Sul
Todo mundo é mar aberto
Todo mundo é céu azul
Todo mundo está vestido
E todo mundo está nu
Todo mundo é a tristeza
Todo mundo é alegria
Todo mundo é solidão
Todo mundo é companhia

E todo mundo é pedra bruta
Todo mundo é lapidado
Todo mundo é jóia rara
À espera do ser amado

Somos zés
Somos marias
Somos anjos
Somos maus
Somos aquilo que somos
Somos paixão visceral
Somos gente
Somos sina
Somos bomba de Hiroshima
Somos a cura do câncer
Somos a febre terçã
Somos hoje
Somos ontem
Somos também amanhã!

E aqui encerro essa toada
Bem na curva da mudança
Nessa fronteira do agora
Nesse mundo sem distância
No vértice do poema
No passo da contradança
No flerte com o novo dia
Na tradução da esperança!


Goimar Dantas
Ilhabela
Litoral Norte de São Paulo
18/11/07

domingo, dezembro 16, 2007

Batida para os beatniks


(Dedicada a Jack Kerouac, Sal Paradise, Dean Moriarty e Old Bull Lee)

Eu quero o que não descortinas
Desejo o que trazes na alma
Silêncio ou infinitas palavras
Tormentos, vazios, verões
A ausência em que te reconheces
As dores e o imenso prazer
A sorte, a esperança perdida
Os sonhos que ninguém mais vê...
Vergonhas reclusas no tempo
Pavores, insônias, injúrias
Temores e os beijos roubados
(na esquina de uma antiga rua...)

Eu quero o teu frio na barriga
E aquela intensa sensação
Da ardência do tapa na cara
Fervores de tua oração
Eu quero o teu corpo caído
Depois do tropeço no chão
E após um afago carinhoso
Oferecer-te a minha mão

Eu posso ser a água benta
Pra tua sede de vingança
Eu quero ser o anjo gouché,
Que ainda te traz esperança
De ti não quero só metade...
Eu quero o teu bem e teu mal
Até porque não se admite
Um mar existindo sem Sal

Só me interessa a intensidade
Presente em ritos de passagem
Só me comove a poesia
Que chega sem fazer alarde
E tudo em você é lirismo
E tudo em você é saudade
Amor e guerra e epopéia
Desejo, volúpia, vontade

No peito essa bala perdida
E a flecha que traz o teu nome
Um fogo cruzado sem trégua
A chama que aqui me consome

Mas quem sou eu – à queima-roupa?
Fantoche, boneca, ilusão...
Presença, passado, futuro
Estrada, rumo, direção
Eu quero o todo, o meio, o nada
Trindade que trazes na alma...
Viagem, partida, regresso
Cidades, atrasos, progressos

Eu sou oratório e o terço
Mística a te virar do avesso
Meu céu é o sorriso devoto
Com que tu ganhas e eu aposto
Sou Eva te dando a maçã
A Gênese desse amanhã
A história de futuro incerto
Pecado, castigo, perdão...

Sou fuga, delírio, destino
Roteiro, horizonte, caminho
O Evangelho, a cruz, a dor
A tentação desses desertos
Maria, de infinito amor

Goimar Dantas
São Paulo
16-12-07

sábado, dezembro 08, 2007

A barca de Pedro


Lá bem longe,
Na morada do vento...
Lá bem longe,
No fundo azul do mar...
Há de haver um poema,
Um pensamento,
Uma forma capaz de me explicar
O porquê da beleza do silêncio
Quando é quebrado assim,
Bem devagar,
Pela música doce dessa tarde.
Melodia que invade esse lugar.
Ninho, sala, varanda, consciência ...
O meu corpo
Que logo quer dançar.
Minha alma embalada,
Meu desejo,
A presença do outro,
A se instalar:
No meu peito
(em forma de saudade),
Nos meus olhos,
Faróis a espreitar
A chegada da barca
E do marujo,
Do meu Pedro...
Que insiste em não voltar.
Esse homem
(que é misto de ilusão)
Quase um Deus
Cujo dom é me inspirar
Uma recordação
Um doce alento
Luz do sol!
Ou um raio de luar?
Ele é mais...
É infinito,
Firmamento,
Poesia,
Que vem me abençoar...
A canção
Que agora estou ouvindo
Nesse dia,
encantado,
à beira-mar.

Goimar Dantas
São Paulo
08/12/2007