quinta-feira, dezembro 30, 2010

Código de Endereçamento Postal

A poesia mora no meu peito:
esse espaço que é avesso à crise, ao drama, à solidão...
Bom mesmo é a felicidade de escrever ouvindo o coração.

Goimar Dantas
Santa Rita do Sapucaí
30-12-2010

quarta-feira, dezembro 29, 2010

Salvador 2010


Minha filhota Tatá Morena, que é baiana de Ilhéus e que, nos últimos dias, deixou seu Estado de origem ainda mais bonito com a sua presença.

Um série de circunstâncias nos levaram a passar as férias deste ano em Salvador, onde já tínhamos estado em 2008. Mas, cá pra nós, voltar a Salvador só faz bem pra alma e o pro corpo, certo? Tudo foi lindo, à exceção da situação de filme de horror que vivenciamos na volta, quando o avião em que estávamos sofreu duas panes graves, a ponto de precisarmos deixar a aeronave em esquema de emergência. Não gosto nem de lembrar. Tudo está detalhado aqui, nessa matéria publicada pelo jornal A Tarde, de Salvador.



Dessa vez ficamos num resort da Praia de Stella Maris, que é linda e ótima pra gente caminhar e fotografar. Por falar nisso, aos poucos publicarei as fotos da viagem na minha página no Flickr. Já coloquei duas. Vá lá acessando aqui!


Yuri e Tatá fizeram um milhão de amigos e passaram os dias se esbaldando na piscina do resort com as brincadeiras e jogos organizados pelos monitores.



Tiramos uma noite pra visitar Cássia e Rogério, amigos de São Paulo que já moraram em Florianópolis, Curitiba e, agora, resolveram aportar em Salvador. Os dois são pais do Tonico e do Chiquinho e nos receberam com carinho e deliciosos quitutes típicos da região, como o cuscuz com queijo de coalho! Amei, Cássia! Ah, há tempos a Cássia também é minha amiga virtual e mantém o blog Sobre meus amores!


Dias depois, fomos visitar seu Orlando e dona Eva, que são os pais da Cássia e também se mudaram pra Salvador. Dona Eva é uma mãezona pra todo mundo. Uma dessas pessoas que têm um quê de anjo, tamanho o carisma e generosidade. Não bastasse isso, é uma artista que pinta, cria, desenha e decora os ambientes como se fossem um pedacinho do céu. Já seu Orlando foi chefe do Maurício aqui em São Paulo e é uma referência pessoal e profissional para ele. Para além disso, seu Orlando é escritor de mão cheia. Quero ser como ele quando crescer. Dê uma passada no excelente blog que seu Orlando mantém e se delicie com um texto de primeira. É o Ofício contador de histórias.


Tatá e Tonico, filho da Cássia, se divertiram a valer lá na casa do seu Orlando. Faltou eu tirar uma foto do Chiquinho, irmão do Tonico (o fofo é um bebê de poucos meses e estava dormindo quando tirei boa parte das fotos lá na casa da Cássia).


Fiz centenas de fotos do Pelourinho, mas minha preferida é esta.


Aqui estávamos voltando do Forte São Marcelo. Um lugar importantíssimo na história do País é que anda meio abandonado. Alô, governo da Bahia?! Que tal dar uma melhorada na pintura, nas instalações e na infraestrutura do local? De lá, a gente tem uma vista linda da cidade e o mar é de um verde inacreditável.



Este é o Thiago, que conhecemos próximo à Barraca da Sira, famosa pela venda de um dos melhores acarajés da cidade. Ele não é lindo? Apareceu na nossa mesa e fez a festa bancando o modelo pra mim.


Não sou muito de entrar na piscina, mas o sol tava de rachar a semana toda e precisei recorrer a ela muitas vezes. Deu pra descansar e curtir muito com meus queridos!


Pra encerrar, uma declaração: eu tenho um amor imenso pelo mar e se pudesse estaria sempre próxima a ele. Na verdade, quanto mais as ondas quebram, mas eu me sinto inteira. Valeu, Salvador! Até a próxima!

terça-feira, dezembro 14, 2010

Microcontos: do twitter para o livro



Oito microcontos meus, cada um com o máximo de 140 caracteres, estão no livro acima (nessa foto, fazendo charme com meus dicionários, manuais de redação e coleção de índios amercianos em miniatura). A coletânea com os microcontos foi publicada pela Fundação Wolkswagen e é fruto de um concurso promovido no Twitter durante a XXI Bienal Internacional do Livro de São Paulo, que aconteceu de 12 a 22 de agosto de 2010.

O primeiro colocado no concurso foi o internauta @felipevalerio, autor deste ótimo microconto: "Esta é a vista que prometi. Agora pula". Achei sensacional. Merecidíssimo. Mas o mais interessante do concurso, na minha opinião, foi o fato de todos os participantes terem seu(s) microconto(s) publicados. Valeu o exercício, o empenho e a diversão de criar histórias usando tão poucos caracteres. Gol de placa da Fundação Wolkswagen. Ou melhor: de letra. :)



O lançamento aconteceu no último sábado, na Livraria Cultura do Conjunto Nacional, na Avenida Paulista, durante o Encontro de Tuiteiros Culturais, projeto lançado em 2009 pela Organização Social de Cultura POIESIS, com apoio da Secretaria de Estado da Cultura. Cada participante ganhou um exemplar do livro, mas para além disso, foi ótimo conhecer esse pessoal que valoriza textos, poesias, aforismos e informações culturais diversificadas por meio do twitter.



O evento foi capitaneado pelo físico, professor e curador do Prêmio Jabuti, José Luiz Goldfarb. Zé, como é conhecido por todos, também foi, durante 18 anos, proprietário da charmosa - e infelizmente extinta - livraria Belas Artes e é, cada vez mais, grande incentivador das políticas públicas direcionadas ao livro no Brasil. Mas seu currículo só se completa mesmo quando a gente diz que ele é um apaixonado confesso pelas possibilidades dessa incrível ferramenta que é o twitter (e a qual eu demorei tanto a me render: mea culpa, mea culpa, mea culpa!).



Na foto acima, o escritor Marcelino Freire e o vereador Floriano Pesaro, que também prestigiaram o evento. Freire assina o microprefácio do livro e esteve o tempo todo ligado a essa iniciativa. No sábado, nos brindou com o que intitulou de "microfala" (deliciosa, por sinal!) sobre microcontos.

Com a língua afiada e o bom humor que lhe são peculiares, o escritor nos levou a refletir sobre a presença da concisão em textos fundamentais da literatura ocidental. A começar por algumas frases e salmos bastante conhecidos da Bíblia, passando, em seguida, para exemplos deixados por mestres da literatura nacional e internacional, todos especialistas na escrita objetiva e contundente expressa em períodos e capítulos curtos que compõem suas obras. Dentre eles, Machado de Assis, Júlio Cortázar, Hemingway e Kafka, sem esquecer autores brasileiros contemporâneos como Millôr Fernandes e Dalton Trevisan.


Aqui, Marcelino aparece com Conceição Mirandola, diretora da Fundação Wolkswagen (simpaticíssima, por sinal).



Quem acompanha o blog sabe que adoro levar a família a tiracolo para eventos literários e culturais. Acho ótimo que as crianças tenham contato com esse universo. E aqui vemos meus filhotes gigantescos acompanhados do meu bem, meu Mau(rício). Meu filho Yuri, aliás, adorou as tiradas de Marcelino Freire e, Deus me ouça, num futuro breve, será mais um leitor desse pernambucano arretado, agitador cultural que tanto tem feito pela literatura no Brasil.


Pra finalizar, minha filhota Tatá junto da mãe coruja. Tatá, diga-se, não sossegou enquanto não localizou meus microcontos no livro. Fofa.com.br, né não?

segunda-feira, dezembro 06, 2010

Nas águas del Fuego




Há livros que nos tiram da rota. São como naves que abduzem, absorvem, puxam para si. Ímãs em forma de texto, título, capa, contracapa, lombada, textura, cheiro. Então a gente se deixa levar por essas máquinas de sonhos que nos conduzem a outros mundos, fronteiras, tempos, dimensões. Passamos a viver a vida de outro. E mais outro. E quantos mais existirem nas histórias. Transitamos na curva das páginas, no horizonte das linhas, no vão das entrelinhas. Caminhos que nos apresentam diferentes cenários, ambientes, atmosferas. E uma vez lá, nossa própria vida vira quimera. Buraco de Alice. Tornado de Dorothy: estamos no “para além”. Não há mais aqui nem agora (tampouco o mundo lá fora).

Foi assim que me senti ao entrar de corpo e alma no tempo e no vento de Os malaquias, primeiro romance de Andréa del Fuego (em edição caprichada da Editora Língua Geral, 2010). Um texto maduro. Fruta carnuda colhida na hora certa. Narrativa de versos lindamente disfarçados de prosa.

E no exercício de um paradoxo delicioso, a moça do fogo contradiz seu pseudônimo e nos presenteia com águas de rio. De mar. De uma hidrelétrica que se instalará em local de desvario. Lugar de falas pausadas. Longos silêncios varrendo uma terra fértil de dramas e de planícies poéticas. Espaço sob medida para adventos misteriosos capazes de inundar a vida dos habitantes de Serra Morena, onde se passa boa parte da trama.

Nesse solo encharcado de enigmas, um raio lançado pela flecha da tempestade é o divisor das águas que separam as crianças Nico, Júlia e Antônio Malaquias, irmãos que, do tal raio em diante, viverão experiências inundadas de real e de surreal. Trindade de solidões entranhadas. Tríade de memórias dispersas que, um dia, talvez, poderão se unir como peças de um quebra-cabeças.

Andrea burilou o texto. Teceu. Tramou. E deu à luz dizeres prenhes de símbolos, códigos e nuances. E munida de seu fuego, a moça aqueceu, cozinhou e nos serviu um relato polvilhado de episódios fantásticos dispostos em capítulos que lembram notas em sobressalto: stacatto. Suspensão de tempos e espaços.

Na noite em que comecei a ler, fiquei tão impressionada que, por vezes, pensei ter tido febre. Calafrios. Espécie de desmaio em beira de rio. Sensação de frio na barriga – como quando a gente desliza pelo arco-íris. Mas o que foi aquilo, afinal? Ouso dizer que foi misto de delírio e de vício. Dependência de virar a página. Vontade de saber tudo sobre os personagens. Muitos deles duplos irmanados e recorrentes, como o casal de crianças gêmeas e as velhas também gêmeas que, assim como vêm, se vão na poeira do chão; as freiras que, por assim dizer, eram gêmeas de hábito e de coração; o empregado e o patrão; a apatia e a tentação e, vertigem suprema(!), os ectoplamas se enlaçando em danças fluidas, geracionais.

Um livro escrito sob o signo das águas que insistem em fazer de Serra Morena e de seus moradores um campo fecundo para a literatura da maior qualidade. Obra-prima. Puro deleite e, verdade seja dita, também lamento: posto que nunca mais poderei lê-la com o coração banhado pelo líquido pleno de expectativas que abarca todas as primeiras vezes em que fazemos ou sentimos algo importante ou definitivo. Verdadeiramente definitivo: como navegar em meio ao Fuego.

Em tempo: para saber mais sobre o livro e sobre a autora, basta clicar aqui e aqui.

quinta-feira, dezembro 02, 2010

Poema em revista




Volta e meia esse blogue recebe a visita luxuosa do professor Leo Ricino. Um mestre que, há 40 anos, leciona literatura e gramática em escolas, universidades e, mais recentemente, empresas da capital paulista. Além de escrever para revistas, frequentemente Leo também é convidado para dar dicas preciosas sobre Língua Portuguesa e Literatura em emissoras de rádio, como a Jovem Pan e a Trianon, além de participações no programa Mulheres, da TV Gazeta.

Leo acompanha meu trabalho desde 2001, quando tive a sorte de conhecê-lo na turma de Comunicação e Letras, no mestrado da Universidade Presbiteriana Mackenzie. É dele a análise do meu poema Baianidade grega, publicado na Revista Viverde, edição de agosto e setembro de 2010. Fico feliz da vida em ter um trabalho analisado pelo Leo. O artigo está disponível na página 18 da revista, cujo PDF está disponível clicando aqui.

quinta-feira, novembro 25, 2010

Quem tem medo de papangu?



Meu primeiro livro com temática voltada para o público infantil chegou da gráfica ontem (clique na imagem da capa e da contracapa para ver melhor). Um sonho que se realiza. Um desejo profundo transformado em palavras, versos, imagens... Cores que explodem em páginas que são como pirotecnia de magia.

Ao recebê-lo, pedi que beliscassem meu corpo, minha alma. Por vezes, parece que acordei mas, ainda assim, custo a acreditar que a história iniciada no sertão da minha infância - quando descobri que meu avô era um papangu! - agora poderá povoar a imaginação de tantas outras crianças.



Nesta foto, ao lado de minha vó Maria, vemos meu saudoso e querido avô Pedro Horácio, que, nos carnavais do sertão, se transformava em papangu.

A verdade é que o livro transcendeu minhas expectativas e se tornou uma obra de arte. Tudo graças às belíssimas ilustrações da artista Cláudia Cascarelli, e também à condução competente do editor Amir Piedade, aliado a toda equipe da Cortez Editora.

Esse post é, também, uma forma de agradecer a todos os que acreditaram nessa deliciosa aventura. A começar por Alessandra Pires, amiga de muitos anos que se tornou agente literária e parceira essencial nessa estrada que exige tanta luta, persistência e teimosia. No fundo, sonho e suor lembram o maravilhoso repicar de sinos, singulares instrumentos que só produzem música por meio da força de quem os toca.

Obrigada!

terça-feira, novembro 16, 2010

Todo o amor que houver nessa vida...




Quem diria, hein, lobo? Quarenta anos... Parece que foi ontem que te vi pela primeira vez, na oitava série. O professor havia saído da sala uns minutos e a bagunça logo se instalou entre os alunos. Foi quando você, do alto de sua autoridade precoce e irrestrita, bateu com força na mesa e gritou a plenos pulmões: "Como é que é?! Vamos parar com essa zona porque eu tô querendo estudar!"

Naquele momento eu soube: você seria para sempre. Você seria para mim. Poucos dias depois, tratei de aplicar o golpe que se tornaria decisivo em nossas vidas: inventei que descendia de uma família de ciganos e pedi pra ler sua mão. O destino, um saco de pipocas e um passeio no alto da Serra do Mar se encarregaram do resto, como bem sabemos. E lá se vão 23 anos!

Parabéns pra você, lobo! Receba essa homenagem singela, mas cheia de amor e carinho!

Em tempo: escolhi as fotos, o texto e a música, mas nosso filho Yuri (cineasta aqui de casa) foi quem fez o vídeo.

Um grande beijo!

domingo, novembro 07, 2010

Posei para a Playgói




Mês passado o blog fez quatro anos. Já disse tudo e mais um pouco sobre mim neste espaço, mas resolvi comemorar (atrasada, como sempre) fazendo uma brincadeira: e seu tentasse me resumir em um único post? Vi que era impossível, mas achei o exercício válido e decidi compartilhar com quem vem sempre por aqui.

Vamos lá: meu apelido de infância é Gói e toda a minha família ainda me chama assim. Minha fruta preferida é jaboticaba, delícia que quando pronunciada carrega um som que considero doce como seu sumo. E sempre que me perfumo, é também com a essência das palavras.

Sou misto de terra, ar e mar. Terra porque apesar de estar longe, me sinto como que entranhada ao solo do sertão onde nasci. Ar porque sou espécie de ave extremamente avoada, com vertigem de altura, mas que ousa se deixar levar nos voos da imaginação. E mar simplesmente porque eu o trago em meu nome: GoiMAR. E não bastasse isso, nasci sob o signo de aquário, com ascendente em peixes. Mas a vida é uma piada pronta e a verdade é que não sei nadar. Então, um dia, ao olhar encantada o oceano à minha frente, escrevi: “Seria sereia / não fosse o medo / de maré cheia”.

Minha cor predileta? Lilás. Livro favorito? Dom Casmurro. Leio por paixão e escrevo por necessidade. Gosto de imprimir memórias e histórias. Tenho a impressão de que quem não escreve se perde, se esvai, some na poeira dessa grande esteira da vida. Morre, enfim, de verdade. Pra mim a escrita é lastro. Mastro onde me agarro.

Quando à noite me deito, sempre agradeço pela coberta, travesseiro, teto, universo. Choro quase todos os dias, basta assistir um noticiário, novela, filme. E a cada nova tragédia concluo, envergonhada, que minha fé é sazonal – uma vez que sofre baixa considerável na época das grandes chuvas, quando centenas de crianças e adultos morrem nas inundações do Sul e Sudeste deste país; ou ainda quando um avião cai, um prédio desaba, um terremoto atinge um país, a seca volta a castigar o sertão e por aí vai. Nessas horas recordo versos desesperados do poema Vozes d’ África, de Castro Alves, decorados quando eu tinha 13 anos: “Deus! ó Deus! Onde estás que não respondes? Em que mundo, em qu’ estrelas tu t’ escondes embuçado nos céus?”

Reclamo exageradamente e as três coisas que mais me tiram do sério são: acordar cedo, comida fria e toalha molhada. Tenho orgulho de ser nordestina, sertaneja, lírica, lunática, solar. E isso nunca atrapalhou meu caso de amor eterno com a cidade de São Paulo que, diga-se, não é ciumenta. Ao contrário: é polígama, volúvel, libertária.

Gosto de contar histórias, fazer versos, textos e contextos. No dia-a-dia me divido, multiplico, adiciono e subtraio e, como a maioria das mulheres: não tenho tempo. Ele é que me tem e me domina numa relação doentia e passional. Mas é preciso dizer que ele, às vezes, me concede a graça de fazer yoga e ir à manicure. Há mulheres que nem isso.

Meus maiores amores são meus filhos, ambos minha razão e minha loucura. Sou um misto de mãe judia e italiana. Vivo dando sermão, arrancando os cabelos, fazendo drama, monitorando suas vidas, fazendo projeções desnecessárias, sofrendo por antecipação. Mas tento melhorar a cada dia, menos no que se refere aos sermões. Acredito que não dar sermão é um descaminho. Uma ausência de palavra, discurso, retórica. E eu me recuso a criar meus filhos sem palavra, discurso, retórica, argumentação.

Fico arrepiada com gente que diz: “Não me arrependo de nada”. Já eu me arrependo de muitas coisas. E a primeira delas é ter gargalhado numa situação muito inadequada e, com isso, ter magoado profundamente minha melhor amiga. Eu tinha nove anos de idade e até hoje tenho vontade de chorar mordendo o travesseiro quando lembro a cena: os olhos dela me fitando incrédulos, cheios de lágrimas causadas por minha colossal insensibilidade... Deus, como lamento!

Amo viajar, mas detesto fazer malas. Então, fazer o quê? Não ir? Ficar? Não ver? Não conhecer? Nem pensar: deixe-me ir, preciso andar!

Tenho medo de avião, sapo, cobra, barata, rato, aranha, morcego, mariposa. Mas sofro mesmo é com o frio. Não tenho nenhuma vontade de neve, fondue, esqui ou lareira. Aliás, lareira pode ser: mas só pra fazer charme quando a temperatura dos corpos estiver bem quente.

Adoro bebida doce, tipo vinho do Porto e batida de morango (dessas com mais leite condensado do que álcool), mas quase nunca me atrevo porque meu fígado se assemelha a um projeto mal feito, inacabado. Bastam dois goles e é batata: a tremedeira nas pernas é certa e a língua solta também. E uma vez solta, ela dispara declamando poemas de Augusto dos Anjos, Drummond e Bandeira. E vamos combinar que declamar Bandeira com voz pastosa é uma tremenda bandeira. Ninguém merece (ouvir).

Gosto de música brasileira, ODEIO feijoada, cerveja, chope e tenho ojeriza a cigarro. Prefiro um trem da CPTM lotado, na hora do pico. E se o trabalho me obriga a entrevistar alguém que fuma, eu vou. Mas me sinto arrasada, humilhada, mortificada, impregnada pela fumaça e pelo odor que abomino e, como diz o samba: “volto pra casa abatida / desencantada da vida”.

Nunca acampei. Acho o fim da picada dormir no chão por opção, ainda mais com bicho por perto. Não tenho um pingo de vontade de escalar, pular de paraquedas, bungee jump, andar de montanha russa. Isso eu deixo pra quem tem coragem. É... Minha covardia é crônica. Não fosse isso, viveria mais (intensamente) do que escreveria, como faz a maioria das pessoas.

Gosto de falar horas ao telefone, com minha irmã e com quer mais puder e quiser. Gosto de dividir a vida com meu bem, meu “Mau"(rício). Adoro lugares espaçosos e acho uma delícia usar pantufas e pijamas com estampas infantis. Gosto de livros, livraria, biblioteca, revistas, museus, arte, fotografia, vista pro mar, roda de amigos, férias, viagens de trem, documentários, seriados, making of, processos de produção, cartas, raridades, barulho de ondas quebrando na praia, pôr-do-sol, comida japonesa, cachorro quente, spaghetti, ovos mexidos, dicionários e programas literários. E se um dia aparecesse o gênio da lâmpada e me concedesse apenas um desejo, esse estaria na ponta da língua: queria meu pai de volta. Pra sempre.

Pra começo, é isso. E como já disse no poema O Amor de Janaína: “No mar e no mais: tudo é sal, saudade. Que existe, apenas, para gerar em seu ventre poemas”. E pra você que me acompanha nesta estrada virtual: muito, muito obrigada! Brindemos (no meu caso com suco) ainda por muitos e muitos anos!

Se eu fechar os olhos agora...



Tá linda essa entrevista! Gosto demais do trabalho do Edney Silvestre e fiquei muito feliz pelo sucesso de seu primeiro romance, o já premiadíssimo Se eu fechar os olhos agora, que lerei tão logo a pilha de livros ao lado da minha cama diminua um pouco.

O fato é que o também escritor Luiz Ruffato conduziu a entrevista maravilhosamente e Edney, por sua vez, abriu o coração como tem de de ser. Ambos nos presenteiam com um verdadeiro show de sensibilidade, inteligência e delicadeza. Recomendo muito, muito, muito!

terça-feira, outubro 26, 2010

Ourivesaria

Para meu pai, Pedro Dantas, que faria 66 anos hoje.

Pedro:
pedra rara.
Dia a dia lapidada
para ornar meu coração:
essa jóia de saudade...
Um rubi, uma esperança!
Que sangra, mas não se cansa,
de pulsar tua lembrança
pra te reviver em mim.

Goimar Dantas
São Paulo
26/10/2010

quarta-feira, outubro 20, 2010

Lembrete

Hoje é Dia do Poeta.
Um esteta que põe letras
nas músicas da alma.

Goimar Dantas
São Paulo
20/10/2010


E para celebrar, publico um pequeno documentário que pesquei aqui, produzido pela editora Alfaguara, como parte das comemorações pelo relançamento da obra do poeta João Cabral de Melo Neto. Os vídeos têm depoimentos de Luis Fernando Verissimo, Chico Buarque, Lázaro Ramos, Ferreira Gullar, Adriana Calcanhotto, Carlos Heitor Cony, Adélia Prado, dentre outros ilustres admiradores do poeta. Apreciem sem moderação!




terça-feira, outubro 19, 2010

A paixão e o pássaro




Eu devia ter uns 8 anos quando vi o homem alado pela primeira vez. Era um Ícaro loiro, de olhos azuis, musculoso e viril como um deus grego. Eu ainda não sabia o que era Grécia, mas quem se importa? O essencial era minha habilidade para identificar um deus quando via um, mesmo pela televisão.

Nunca mais esqueci a cena. E nem poderia, uma vez que o homem-pássaro, que atende pelo nome de Mikhail Baryshnikov, se tornou alvo de uma intensa paixonite platônica de infância que, diferentemente das demais (sim, eu tive várias), perdura até hoje. Ícaros, como todos sabem, são inacessíveis. E, talvez por isso, de nada adiantava o estilingue dos meus olhos atirar sobre ele sucessivos pedaços do meu coração.

Baryshnikov voava alto demais, completamente ignorante de meus suspiros e devaneios de menina. O passar do tempo, por sua vez, apenas intensificou o alcance de suas asas. Além de bailarino renomado, o homem-pássaro também se firmou como ator, estrela de campanhas publicitárias, celebridade. E então pude vê-lo amiúde: em revistas, filmes, programas de tevê, comerciais disso e daquilo. E era incrível observar o modo como ele pousava – e posava – ao lado de tantos mortais, que só serviam para ressaltar o brilho superior de sua plumagem.

E hoje e amanhã ele planará sobre os palcos de São Paulo, aos 62 anos, ainda lindíssimo – posto que deuses jamais envelhecem. Mas como o destino é, por vezes, um piadista sem graça, perdi o prazo para a compra de ingressos, disputadíssimos, como é comum aos espetáculos protagonizados por mitos.

Moral da história: meu Ícaro prossegue tão inacessível quanto o meu coração – hoje, particularmente, mais despedaçado do que nunca.

terça-feira, outubro 12, 2010

Vida de Maria



A dica desse lindíssimo filme de animação veio do amigo Antonio Erivan Gomes, sertanejo forte que, durante a infância, recebeu a oportunidade de romper os ciclos que poderiam apriosioná-lo a uma vida desprovida de educação e, consequentemente, liberdade para voar em busca de seus sonhos.

O problema é que muitas crianças não têm a mesma sorte de Erivan e, por isso mesmo, permanecem numa vida sofrida, muitas vezes perpetuando-a por gerações: filhos, netos, bisnetos... Todos seguindo na mesma toada que aprisiona sonhos, talentos e potencialidades.

Neste Dia das Crianças, esse filme nos ajuda a refletir sobre infância, oportunidades, educação, ciclos que podem (e devem!) ser rompidos.

Fica aqui o meu agradecimento especial ao Erivan. E também o meu desejo genuíno (ou seria ingênuo?) de que todas as crianças possam ter as oportunidades que merecem.

sexta-feira, outubro 08, 2010

Só 10 por cento é mentira



Nada como Manoel de Barros pra encerrar uma semana tão cansativa quanto essa que tive. Outubro começou quente e tudo indica que terminará fervendo. Por isso, vim aqui escrever este post, na esperança de recuperar as forças falando sobre um poeta.

Infelizmente, não conheci a poesia de Manoel de Barros na escola. A bem da verdade, demorei anos para encontrá-la na esquina das prateleiras das livrarias e na curva de algumas entrevistas que ele concedeu a jornais, revistas e emissoras de televisão.

Então, em dezembro de 2004, aconteceu: numa linda noite de luar, em pleno calor do sertão potiguar, mergulhei fundo em seu livro Poemas Rupestres e, desde então, prossigo submersa no líquido amniótico de suas palavras. Vez ou outra venho à superfície, mas só pra dar mais valor às águas pantaneiras da poesia de Barros.

O trailer acima é do premiado documentário Só 10 por cento é mentira, cujo título rende homenagem à famosa máxima de Barros, que diz assim: “De tudo o que escrevo, 90% é invenção. Só 10% é mentira”. Genial, não? Simplesmente genial.

Mas o mais absurdo dessa história é que ainda não vi o documentário. E eu gostaria muito que isso fosse mentira, pura invenção. Por outro lado, não ter visto esse filme me traz aquela sensação prazerosa de coisa boa que a gente tem certeza que está para acontecer. Sabe aquela pré-felicidade? E claro que tudo isso me lembra muito o conto Felicidade Clandestina, meu preferido da Clarice Lispector. É isso: o que me conforta é saber que essa felicidade está logo ali, na esquina, na curva de alguma locadora decente (porque nem todas, afinal, têm documentários brasileiros, mesmo que premiados), esperando por mim.

sexta-feira, outubro 01, 2010

Bethânia na intimidade



Dia desses, saí do computador após 12 horas de trabalho, liguei a televisão no Canal Brasil e deparei com o documentário Maria Bethânia – Pedrinha de Aruanda (2007), em que o diretor Andrucha Waddington retrata as comemorações, emoções, encontros e lirismos decorrentes do aniversário de 60 anos da cantora.

Não peguei o filme do começo, mas tive a sorte de poder ver cenas maravilhosas, como essa do vídeo acima, em que Bethânia conta uma história deliciosa durante um jantar na casa da mãe, Dona Canô, em Santo Amaro da Purificação. Para quem quiser ver outras cenas do documentário, é só dar uma busca no You tube, nesta página aqui.

Mas há uma cena linda que, infelizmente, parece não estar no You tube (pelo menos procurei e não achei...). Nela, numa viagem de carro, à noite, com o irmão Caetano, Bethânia pergunta: "Sabe como Fernando Pessoa chamava a lua?" Ao que Caetano responde: "Ué, ele não chamava de lua?". E Bethânia: "Não. Ele chamava de Nossa Senhora do Silêncio".

E o resto? Bem, o resto também é poesia.

Recomendo muito!

sexta-feira, setembro 24, 2010

O som e o sentido



Semana passada, dei uma entrevista para a jornalista Miriam Ramos, da Rádio USP, juntamente com o meu biografado, o editor José Xavier Cortez. O tema foi a biografia Cortez - A saga de um sonhador, que assino em coautoria com a socióloga pernambucana Teresa Sales.

O bate-papo foi delicioso e pontuado por trilha sonora escolhida por mim e por Cortez. Cada um de nós podia selecionar 3 músicas que, na minha opinião, deram um charme todo especial à conversa. Você pode ouvir a entrevista, dividida em dois blocos, clicando aqui.

Sei que deveria ter postado isso antes, mais precisamente no dia em que a entrevista foi ao ar, em 20 de setembro, mas não deu... Estou em um ritmo de trabalho muito intenso e, por isso, só consegui divulgar mesmo no meu Facebook e no twitter (coisa rápida, muito rápida).

A verdade é que ando com uma saudade danada de escrever crônicas e relatos sobre minhas entrevistas para o livro Rotas literárias de São Paulo. Espero que, nos próximos dias, eu consiga voltar a um ritmo de vida um pouco mais tranquilo.

Em tempo: o nome deste post é um plágio descarado do título de um livro do José Miguel Wisnik, um escritor/professor/ensaista que eu adoro :)

sábado, setembro 11, 2010

Para Alice



Lendo Alice Ruiz
cessam os ruídos.
Ali se é feliz.

Goimar Dantas
São Paulo
Setembro/2010



Dia desses, estive na casa da poeta e compositora Alice Ruiz. O objetivo era entrevistá-la para meu livro Rotas literárias de São Paulo. E foi um privilégio conhecer o espaço onde a poeta cria, canta, compõe. Ali, Alice expôs sua paixão por São Paulo, por seu trabalho, por seus parceiros na música, na vida, na escrita.


O jardim de Alice: paisagem/passagem estratégica entre a sala e o escritório.

Naquele espaço verdadeiramente verde, bucólico e arejado, condizente com uma casa onde vibra o som e o sentido, Alice me recebeu munida de sorriso, simpatia, sinceridade e sensibilidade – quarteto que compõe prosas inesquecíveis. E a poeta contou e encantou. De tudo um pouco. Do pouco, muito. Do muito, múltiplas sensações.

Tomamos assento na sala, próximas ao piano. E talvez por estar sempre conectada ao espírito dos instrumentos, Alice me fez ouvir música durante todo o tempo em que durou a conversa. De sua voz brotavam cânticos, cantigas de amor e de amigo, versos em meio a solfejos.

E, vez ou outra, embalada pelas melodias, pensei ter visto nos olhos de Alice um quê de mar cujas águas, serenas, não viram necessidade de rebentar na praia de suas faces.

Era um dia de calor em pleno inverno paulistano, e no campo daquele cenário, passei mais de uma hora colhendo os frutos da memória de Alice: versos e reversos fluindo na prosa de sua história. E ouvindo Alice, em meio à colheita, tive certeza: realmente nunca escrevi haikais (como ela o faz, sabiamente seguindo as regras poéticas desse estilo). O que eu faço, no máximo, é "Raio que cai" – roubando uma expressão deliciosa criada por meu bem, meu "Maurício" para definir esse tipo de poesia que ouso praticar com poucas frases.

“Raios que caem” à parte, o fato é que, ao lado de Alice, vivi uma dessas horas mágicas que jamais se perderão no vão da memória. Até porque só se perde na memória o que não foi guardado com o pulso ritmado do coração. Daí a constatação: os momentos que passei com Alice serão como os versos daquele poema que a gente sabe de (coeur).

E para saber mais sobre Alice Ruiz, basta clicar aqui. Encerro deixando vocês com uma música linda que Alice compôs com um de seus parceiros mais frequentes: Arnaldo Antunes.

sexta-feira, setembro 10, 2010

quinta-feira, setembro 02, 2010

Dilacerado



E essa dor,
doravante?
A-dor-me(re)-ce-rá um instante?


Goimar Dantas
São Paulo
25/08/2010

segunda-feira, agosto 30, 2010

A morada de Mário


Detalhe das teclas do piano que pertenceu a Mário de Andrade. O poeta utilizava o instrumento para ministrar aulas particulares às moçoilas paulistanas, nas décadas de 20 e 30 do século passado.

Por mais diferentes que sejam as pessoas que entrevisto para o meu livro Rotas Literárias de São Paulo, todas têm algo em comum: o amor, a admiração e o respeito por Mário de Andrade, sem dúvida um dos artistas mais admiráveis que esse país já teve. Músicólogo, poeta, romancista, crítico de arte, pesquisador do folclore nacional e, não bastasse isso, um verdadeiro apaixonado pela cidade de São Paulo.


Outro ângulo do piano de Mário de Andrade...

Mário teve participação efetiva na histórica Semana de Arte Moderna de 22, que mudou para sempre o rumo das artes no Brasil. Foi um dos grandes pensadores e realizadores do cenário cultural brasileiro e paulistano, nesse último caso, por meio de seu trabalho à frente do Departamento Municipal da Cultura de São Paulo.



A casa de Mário de Andrade (primeira à esquerda), onde hoje funciona a Oficina da Palavra, fica no bairro da Barra Funda, na famosa Rua Lopes Chaves, tão presente em inúmeros de seus textos e poemas. Para saber mais sobre as atividades da Oficina, cujos cursos são todos gratuitos, clique aqui.


Fiz questão de fotografar a placa da rua.



Essa estante, juntamente com o piano, são os únicos objetos originais da época em que Mário viveu na Casa. Já os documentos, livros e demais móveis que compõem o acervo do escritor estão no Instituto de Estudos Brasileiros (IEB), na Universidade de São Paulo (USP).
A Casa, entretanto, é muito visitava por fãs do poeta, que desejam conhecer de perto o local onde Mário passava seus dias e noites: sempre escrevendo, tocando, registrando ideias, recebendo amigos.


Também visitei o porão da Casa, onde tive acesso a essas raridades: fotografias de Mário, à espera de patrocínio para uma exposição permanente.


Acima, vemos mais um quadro trazendo uma fotografia do poeta, envolta em plástico bolha, no porão da Casa...


Reproduções de fotos do autor de Paulicéia Desvairada e Macunaíma..

Este trabalho está me dando a oportunidade de conhecer o obra e a vida de Mário de forma mais detalhada, o que é ótimo. Tenho lido pilhas de livros dele e sobre ele. Um mergulho essencial numa personagem incrível e, por consequência, numa São Paulo mais lírica - que ele amava retratar em seus textos. Descobri um homem extraordinário, alvo de milhões de teses, livros, artigos, ensaios. Mais ainda falta alguém escrever "a" biografia de Mário de Andrade. Quem se habilita?

segunda-feira, agosto 23, 2010

Cordel na Cortez 2010



E essa vai para os amantes, apreciadores, curiosos e interessados nas artes que compõem a Literatura de Cordel! Começa hoje e segue até dia 28 de agosto o mais tradicional evento relacionado ao tema em São Paulo. É o Cordel na Cortez, que acontece na Livraria Cortez, localizada à Rua Bartira, 317, Perdizes.

Em sua sétima edição, o evento tem a coordenação do poeta Moreira de Acopiara e presenteia o público com uma série de palestras, oficinas, recitais, contação de histórias, entre outras atividades desenvolvidas por estudiosos, poetas, xilogravuristas, contadores de histórias e demais especialistas no assunto. Tudo isso regado a petiscos tipicamente nordestinos!

Achou pouco? Pois você ainda contará com a simpatia de toda a turma da Cortez, a começar pelo Ednilson Xavier, diretor-geral do evento, que só falta estender tapete vermelho pro público passar. Lá você também encontrará ele: o homem, o mito, o pop star José Xavier Cortez, que é o editor e livreiro mais badalado de São Paulo! Tá duvidando? Então, segura essa: só neste ano o homem foi tema de um documentário, uma biografia (que tive o prazer de escrever junto com a querida Teresa Sales) e um lindíssimo livro infantil intitulado Como um rio, de autoria da competente educadora Silmara Casadei.

É mole ou quer mais? Ok, ok, você quer mais... Então, simbora pra Cortez, homi! Tá esperando o quê?

Ah, para ter acesso à programação completa, basta clicar aqui.

Recomendo muito, muito, muito!

Confessionário



É raro escrever com tinta.
Geralmente eu uso sangue, suor e lágrimas.
Dói, mas o texto agradece.

Goimar Dantas
São Paulo,
16/08/2010

domingo, agosto 22, 2010

Bienal 2010


José Eduardo Agualusa, escritor angolano.

No último sábado, às 19h, na Bienal Internacional do Livro de São Paulo, o escritor angolano José Eduardo Agualusa compôs ótima mesa de debates com o escritor moçambicano Mia Couto, ambos mediados pelo crítico literário Manuel da Costa Pinto. Foi uma maratona chegar à Bienal no sábado, penúltimo dia do evento. Havia milhares de pessoas no Pavilhão do Anhembi e juro por tudo quanto é sagrado que, na entrada do local, temi ser pisoteada. Aquilo estava um horror. Mesmo tendo convite e credencial, era preciso passar, primeiro, por uma entrada geral que, para o meu desespero, parecia afunilar toda a população da capital paulista. Mas, no final das contas, consegui não só sobreviver como também assistir as duas mesas mais cobiçadas do dia: a das 17h, com Lygia Fagundes Telles, e a das 19h, com os africanos Agualusa e Mia Couto.


Adorei o sorriso do escritor Mia Couto...

... e também gostei demais de suas reflexões sobre língua e literatura brasileira e africana. Aliás, Couto bateu um bolão com Agualusa. Os dois são amigos de longa data e a sintonia entre ambos era incrível. Parecia jogo de volêi: um levantava e o outro cortava. Quem ganhou foi o público que, por sinal, estava afiadíssimo nas perguntas - coisa rara em eventos dessa natureza. Por sorte, havia muitos pesquisadores e amantes da literatura africana na plateia composta por cerca de 200 pessoas.

Os escritores ressaltaram o fato de nos últimos 10 anos o Brasil ter dado mais abertura aos escritores africanos de Língua Portuguesa, cada vez mais presentes nas livrarias e eventos literários realizados no país. E Agualusa foi além: para ele, esse diálogo também se deve ao interesse do governo brasileiro em estreitar relações com o continente africano: "O presidente Lula viajou várias vezes à África durante sua gestão e isso, claro, contribui para o intercâmbio de informações entre os dois países", ressaltou.

O debate abordou, dentre outras coisas, os seguites temas: reforma ortográfica; observações sobre as diferenças e semelhanças entre Brasil e África; histórias vivenciadas pelos dois autores em nosso país (todas elas deliciosas, engraçadas, comoventes!); a parceria de ambos na elaboração de peças teatrais e o romance Milagreiro Pessoal, que Agualusa acaba de concluir. O autor falou, ainda, sobre a Editora Língua Geral, que mantém no Rio de Janeiro juntamente com outros dois sócios.

O momento mais emocionante, a meu ver, foi protagonizado por Agualusa que, ao ser questionado sobre a importância do escritor angolano Ruy Duarte, morto este ano, não conseguiu segurar as lágrimas: "Ele era um grande amigo. Há 20 anos venho batendo na mesma tecla: Ruy Duarte é um dos maiores escritores da Língua Portuguesa! Não me conformo com sua morte. Sem sua presença, Angola fica mais triste e escura", afirmou, com voz embargada.


Lygia Fagundes Telles: a grande dama

E antes da mesa de Couto e Agualusa, assisti, pela segunda vez nessa Bienal, uma palestra da grande dama das letras nacionais: Lygia Fagundes Telles, 87 anos. Lygia discorreu sobre seus romances, personagens, amores, fantasmas, invenções e memórias. A autora é uma grande contadora de histórias e é sempre um deleite poder ouvi-la. Na semana passada, a criadora de romances e contos, dentre os quais destaco o genial A estrutura da bolha de sabão, meu preferido, nos falou de suas lembranças com Monteiro Lobato - um dos homenageados da Bienal. Foi lindo. Usei o gravador digital e registrei tudo, mas também gravei suas palavras no coração, como tem de ser.


Lygia, mediada pelo crítico literário Manuel da Costa Pinto (à esquerda) e o jornalista Ubiratan Brasil (à direita).

Enfim, este ano só consegui ir à Bienal dois dias, e apenas ontem pude levar a máquina para exercitar meu lado "fotógrafa". Na minha primeira visita ao evento, no último dia 13, tive de usar o celular para fotografar. Ainda não baixei as fotos. Se ficarem minimamente decentes, prometo postá-las aqui.


E lá estava eu, quase 21h da noite de sábado, cansada, mas feliz da vida por ter assistido às palestras e, principalmente, por sobreviver ao tumulto na entrada do Pavilhão. Ao que tudo indica, escapei por obra e graça do Dr. House, santo protetor do dia, que você pode ver estampado em minha camiseta:)

segunda-feira, agosto 16, 2010

Tradição lírica



O advogado aposentado Armando Marcondes Machado Jr., um dos ex-presidentes do Centro Acadêmico XI de Agosto, da Faculdade de Direito do Largo do São Francisco (USP), reuniu, durante 20 anos, um verdadeiro arsenal de informações sobre os 30 mil estudantes que, entre 1827 e 2006, se formaram nessa que é uma das faculdades mais tradicionais do país.

A pesquisa se transformou numa obra que, por assim dizer, tem um quê de proustiana, na medida em que é composta por 7 volumes e um livro extra(!), publicado em 2007, dessa vez agrupando informações e poesias dos poetas e prosadores que já passaram pelo local.


Alguns volumes da coleção escrita por seu Armando.

Machado Jr, conhecido por todos como "seu Armando", se dedicou ao projeto de forma apaixonada e abnegada. Sem ajuda financeira de qualquer espécie, em tempos pré-Lei Rouanet, patrocínios e afins, o advogado precisou esperar até a sua aposentadoria, de modo que tivesse a quantidade suficiente de horas para dedicar-se à empreitada.

Durante as duas décadas que o trabalho durou, seu Armando vasculhou pilhas de documentos e arquivos os mais diversos para levantar o máximo de informações possíveis sobre os estudantes e turmas que passaram pelas famosas arcadas da faculdade. Precisei me segurar para não chorar durante a entrevista porque, cinco minutos após iniciar nossa conversa, descobri, para meu deleite, que seu Armando foi colega de turma da escritora Hilda Hilst que, de acordo com a pesquisa de seu Armando, colou grau em cerimônia solitária, dia 19 de setembro de 1953, meses depois da maioria de seus colegas. É... Papai do céu é bom demais comigo. Amém.



Aqui e ali, a faculdade preserva bustos, fotografias de poetas, reprodução de versos em monumentos e documentos sobre os grandes autores que frequentaram o lugar. Alguns desses documentos, bem como objetos, estão expostos no pequeno museu que a faculdade mantém.


Estudantes se reúnem no pátio das arcadas mais famosas de São Paulo, em foto feita em abril deste ano.

Caminhar sob as arcadas do Largo do São Francisco é conectar-se ao espírito de grandes personalidades das letras nacionais. E não é pra menos. Basta conferir uma pequena lista de quem já estudou ali para sentir o lirismo que impera no local. Espia só a listinha: Castro Alves, Fagundes Varela, Bernardo Guimarães, José de Alencar, Raul Pompéia, Monteiro Lobato, Oswald Andrade, Vicente de Carvalho, Lygia Fagundes Telles, Hilda Hilst, Haroldo e Augusto de Campos, Décio Pignatari, Guilherme de Almeida e Menotti Del Picchia. Isso pra ficar, claro, só na esfera literária. (Nem me atrevo a falar dos 12 presidentes da república, governadores, senadores e empresários de sucesso que saíram das arcadas diretamente para o comando das principais instituições nacionais porque essa, como sabemos, é uma outra história).

Sem dúvida, a Faculdade de Direito do Largo do São Francisco compõe uma trajetória indispensável para os que, como eu, são aficionados por colecionar memórias e histórias das rotas literárias de São Paulo.

domingo, agosto 08, 2010

domingo, agosto 01, 2010

O sonho, o santo e o sorriso


Dedico esse texto à dona Maria Onélia, minha mãe, que voltou a sorrir.



Sonhei que estava deitada, com minha mãe, numa cama de casal. Era noite alta e, no teto do quarto, havia um buraco enorme por onde víamos, abismadas, milhares de estrelas se movimentando em altíssima velocidade. Como carrinhos de bate-bate em celestial parque de diversões, elas aceleravam umas de encontro às outras, se espatifando com vontade e emitindo sons agudíssimos, semelhantes ao tilintar de cristais quando se quebram.

O brilho que produziam, em contraste com o negrume do céu, originava um espetáculo ímpar, capaz de emudecer qualquer criatura – até mesmo a mim e a minha mãe. E é bom que se ressalte que não há ninguém nesse mundo capaz de nos vencer em tagarelice. Mas o fato é que aquela radiante guerra nas estrelas surtia em nós um efeito paradoxal: uma paz nitidamente superior. Evidente que qualquer palavra soaria inútil.

Despertei na madrugada, maravilhada por sonho tão bonito. Pensei em pegar um papel e anotá-lo, mas desisti. Deduzi, afinal, que era impossível apagar algo assim da mente. Mas os meandros do subconsciente são mesmo indecifráveis. Tanto é assim que no dia seguinte acordei tomada pela sensação de que tinha tido um sonho deslumbrante, mas não conseguia me lembrar de nada. Sofri essa perda arrebatadora durante horas.

E então veio a noite, que me encontrou na livraria mais incrível de São Paulo. Lá, bisbilhotando a prateleira de poesia, deparei com um exemplar de Esse ofício do verso, de Jorge Luis Borges. O livro, que eu ainda não conhecia, é, se não me falha a memória, de 2007, e reproduz uma série de palestras proferidas pelo autor de Ficções na década de 60 do século passado. A obra é um acontecimento, uma vez que as tais palestras estavam em fitas cassetes descobertas apenas há poucos anos.

Comecei a ler o livro ali mesmo e, logo nas primeiras páginas, Borges fez uma de suas incomparáveis analogias, dessa vez usando a palavra “estrela”. Então, de imediato, recordei o sonho em sua totalidade. Meu coração, tamanha emoção e alegria, adquiriu peso de pluma. Respirei fundo, enchi os olhos d’água e agradeci, em pensamento, a esse que é um dos santos de minha devoção. Com a mente voltada à reverência, entoei: “São Jorge Luis Borges, obrigada pela graça alcançada. Amém”.

E embora o Jorge a que me refiro seja diferente do de Caetano, Fernanda Abreu, Benjor e de tantos outros, vale aqui a canção. E a intenção:

sexta-feira, julho 30, 2010

Minutos de sabedoria



A escritora e jornalista chilena Isabel Allende é movida à paixão. Paixão pela arte de contar histórias. Paixão pelas causas ligadas à temática feminina. Vale muito a pena reservar um tempinho (17 minutos, sendo mais exata) para ouvir essa mulher que já viu e viveu muitas coisas e que, melhor ainda, desenvolveu sensibilidade e atenção especiais às causas verdadeiramente importantes.

Nessa palestra tão deliciosa quanto surpreendente, ela nos conduz por muitas reflexões e histórias reais, dentre elas, duas ou três que, diga-se de passagem, conseguem ser ainda mais impressionantes do que tudo o que a chamada literatura fantástica já ousou produzir... O vídeo tem legendas em português, basta clicar em "view subtitles" e selecionar este idioma. Eu recomendo muitíssimo.

sábado, julho 24, 2010

José, Pilar e um devaneio



Estou contando os dias pra assistir José & Pilar, do diretor Miguel Gonçalves Mendes. O filme aborda a relação do escritor português José Saramago com a jornalista espanhola Pilar del Rio, sua esposa durante mais de 20 anos. Eu poderia postar só o trailer do filme, já disponível no You Tube, mas preferi a matéria exibida pelo ótimo programa Entrelinhas, da TV Cultura, porque vai além e traz uma bela entrevista com o diretor.

Adoro filmes dessa natureza porque me interesso muitíssimo pelas pessoas, pelo modo como se portam no mundo, por seu processo de trabalho, suas escolhas, amores e lugares onde, por motivos vários, decidem habitar. Gosto de saber sobre suas manias, idiossincrasias, desejos, erros, acertos.

Gosto de observá-las por ângulos variados, de enveredar por seus labirintos, mistérios, memórias. Sinto prazer em acreditar que as conheço profundamente, mas também gosto quanto me surpreendem provando que isso é impossível. Quero saber quais suas músicas e livros preferidos, conhecer seus ritos, identificar seus gestos mais repetidos, suas qualidades, defeitos, segredos. Gosto tanto do ser humano que me espanto.

A vida de uma pessoa me interessa tanto quanto sua obra. No que se refere a escritores, por exemplo, adoro descobrir que fulano escreveu determinado texto porque estava apaixonado por beltrana ou influenciado por isso ou aquilo. Gosto de cruzar informações, de intertextualidades, influências. Gosto de ler cartas trocadas entre pessoas que já se foram ou que ainda vivem (mas que mal se lembram de que um dia escreveram as tais cartas). E é mágico sentir que o que descrevem entra pelas retinas da janela da minha alma como se fosse um filme, um livro, uma cena de um grande clássico.

Gosto de resgatar histórias empoeiradas, adormecidas no interior de gavetas, baús, caixas, corações. Gosto de trazer à tona lembranças repletas de carinho, amor, dor, humor. Histórias que corriam o risco de serem para sempre apagadas das linhas do mundo, não fosse a minha intervenção tão indiscreta.

Por isso escrevo: para tentar eternizar pessoas, histórias, coisas, eventos. Pura pretensão, eu sei... Mas uma pretensão que me faz muito, muito feliz.

Em tempo: dedico esse devaneio a todos os Josés e Pilares do mundo.

sexta-feira, julho 23, 2010

Yuri superstar



Quem acompanha esse blog sabe: meus filhos têm lugar cativo por aqui. E já faz um tempo que eu estava querendo postar a vertente "Billy Eliot" de Yuri, meu primogênito. Os três leitores fiéis deste blog já devem ter lido em minhas confissões anteriores: eu não danço nada, infelizmente. Porém, Yuri parece ter herdado a cadência, a malemolência e a capacidade espetacular de requebro de boa parte da minha família que, tipicamente nordestina, costuma se esbaldar com extrema categoria pelos arrasta-pés da vida.

A coisa é sofisticada: a maioria arrasa no forró, mas tenho primas e primos que vão além e mandam ver em diversas modalidades. Nesse contexto, minha ausência de molejo nas pistas pode ser encarada como um daqueles mistérios verdadeiramente insondáveis, que insistem em residir entre o céu e a terra de minha vã filosofia. Tergiversações e lamúrias à parte, tá aí o vídeo mais recente que meu Fred Astaire e seus amigos inseriram no You Tube. Trata-se da apresentação do grupo de dança que acabaram de criar, denominado: "Star Company", especializado na mais nova modalidade da dança contemporânea adolescente: o free step.

É também o primeiro vídeo estilo "superprodução" dos meninos, uma vez que foi gravado em duas locações: nas dependências do condomínio onde moramos e no cenário exuberante do Parque Villa-Lobos, em um lindo dia de sol deste inverno. E lá no Villa-Lobos, os integrantes do grupo se apresentam e finalizam o vídeo com o que chamam de "combo" (que é quando todos dançam juntos). Enfim, um deleite pra mãe coruja nenhuma botar defeito.

domingo, julho 18, 2010

Do sentido das coisas




Um poema poderá, quem sabe,
aquecer esse coração que pulsa trêmulo
de frio.
Então será como aquele cobertor que o pai,
tomado de amor, espalhou sobre a filha
numa madrugada fria da infância.
O cobertor era roto.
Mas o amor do pai...
Esse era de um acolchoado nobre o suficiente para aquecer a menina.
Trinta anos depois, o poder e o calor daquele amor
enchem uma recordação de sol e saudade.
Uma memória rara.
Um poema.
Finalmente o inverno faz sentido.

Goimar Dantas
São Paulo
18/07/2010.