terça-feira, junho 24, 2008

Prece junina

(Festa Junina - Óleo sobre tela, de Yole Travassos)


Senhor João, da fogueira
Senhor João, do balão
Senhor João, da pipoca
Senhor João, do quentão...

Me leva num vôo cego
Direto pro meu sertão
Pra pular com a minha gente
Alegrar meu coração!

Pra devolver o calor
Que esse Inverno me roubou
E pra tirar meu espírito
Debaixo do cobertor...

Me faz, de novo, menina!
Me deixa ver meu avô
O rei das estripulias
Pedro Horácio, sim, senhor!

Aquele que dança hoje
No chão do reino do céu
E que me acena, sorrindo...
Charmoso, com seu chapéu

Típico de um londrino
Perdido, em pleno sertão
Por fora: europeu sério
Por dentro: um folião!

Me leva pra minha infância
Meu santinho, São João...
Me faz rever minha história
E na curva dessa memória
Faz sorrir meu coração...

Goimar Dantas
São Paulo
24-06-08

2 comentários:

Zilmara Dahn disse...

Embora a fumaça urbana não permita o cheiro do quentão em minha memória, é bonito ver o quanto vc alimenta essa identidade que eu jamais tive.

É bonita essa sua saudade de coisas que não faço idéia.

Fui gerada no meio do êxodo, mas de tanto ler sobre seus laços, no fundo,consigo acreditar, que também são meus.

bjimm

poesia potiguar disse...

Tenho certeza de que se, como eu, você tivesse a oportunidade de voltar lá de vez em quando, veria que alguns laços, de fato, são inquebrantáveis.

Veria as fotos de vô Pedro Horácio, nos ábuns da casa de Tio Arnaldo ou expostas na Fazenda de Zé Eliu... Nosso avô sempre suado, com seu chapéu (boina) de feltro, dançando nos dias de festa... Ouviria as histórias que Vó Maria conta sobre ele, na época em que assumia a identidade de Papa-Angu, nos carnavais... Ouviria dona Francisquinha Confessor relatando as proezas e graças do nosso pai, quando jovem. Ela, bem velhinha, disposta a compartilhar memórias que, infelizmente, não temos...

Meus laços também são mais fortes porque, de fato, brinquei muito naquela Praça, comi pilhas de doces na venda de seu Ivo... Estudei naquela escola, freqüentei, muito mais, a casa mítica de Tia Ciada, que cedia a televisão para toda a criançada da rua, na hora do Sítio do Pica-Pau Amarelo. Fora isso, tem o que não me lembro... Mas sinto... Como, por exemplo, os braços afetivos de Elialda, me envolvendo todas as tardes, no passeio vespertino. Eu aos dois anos de idade, e ela cuidando de mim tão bem, como se fosse minha mãe... Eu poderia ficar horas discorrendo tanto sobre o que lembro verdadeiramente quanto sobre o que me contam.

Mas, vez por outra, prefiro mesmo escrever. Palavras-legado que deixarei para você, para as crianças e para quem mais quiser.

No fim das contas, acho que Japi é a minha Macondo (a terra inesquecível onde Garcia Márquez viveu a sua infância)...

E como diria Guimarães Rosa: "O sertão é o mundo".

Beijos!