sexta-feira, novembro 28, 2008

Nasceu!



Tatá e Yuri. Foto feita no primeiro final de semana que ela passou em nossa casa.




Conheci minha filha há três anos, num abrigo localizado na Zona Leste de São Paulo. Nossa família parecia estar completa até então. Eu, Maurício e Yuri sempre nos bastamos. Não fomos ao abrigo com a intenção de adotar ninguém. A idéia era só passar uma tarde divertida com as crianças. Há anos ajudávamos esse abrigo com sacolinhas de Natal e pequenas doações. Então, recebemos o convite que mudaria nossas vidas para sempre.

Nossa amiga Valéria de Paula Queiroz, que era voluntária do abrigo, nos disse: "Gente, vamos lá conhecer as crianças que vocês ajudam". E nós fomos. E lá chegamos. E uma hora depois, nós a vimos. Linda, com seus olhos de índia nos chamando para ela. Para dentro dela. Para o mundo dela. Para a alma dela. E nós fomos. E o mundo, como o conhecíamos, se transformou por inteiro. Era 18 de setembro de 2005.

E, depois disso, lutamos oito meses tentando conseguir autorização judicial pra que ela passasse um final de semana aqui em casa... A história de vida dela era complicada demais e o juiz temia que nossas intenções não fossem sérias. Temia que fosse fogo de palha. Por não estarmos numa fila de adoção, éramos tratatos como párias, como marginais. Fizeram um levantamento no sistema pra ver se nenhuma família estava interessada nela. Claro que não acharam ninguém. Até porque a esmagadora maioria dos que estão na fila só quer adotar bebês brancos e com até dois anos de idade, no máximo. Foram meses de estresse. Meses nos deslocando, atravessando a cidade para vê-la, a cada 15 dias. Era desesperador olhar pra ela e perceber que o cabelo, a pele, as roupas... Tudo poderia estar melhor se ela pudesse estar conosco desde o dia em que a conhecemos... Mas a Lei dos homens é muito esquisita, demorada, defasada... E nada podíamos fazer. Não podíamos sequer visitá-la toda semana, de modo a não deixá-la mais ansiosa e confusa do que já estava.

Finalmente, em abril de 2006, ela passou a vir para nossa casa nos finais de semana. E aí começou outro drama: tínhamos de devolvê-la para o lar no domingo. E era aquela choradeira. E eram nossos corações partidos. E era nossa vontade de xingar, de gritar, de espernear, de bater em todo mundo. Afinal, era a nossa filha, desde o primeiro momento... Não desejo essa dor pra ninguém.

Até que, um mês depois, aconteceu. O juiz - já não era sem tempo - ficou comovido quando soube que minha filha estava doente e muito triste por conta dessa situação de ter pais e, ao mesmo tempo, não ter... Precisou que ela tivesse febre e que fosse levada para o hospital. Precisou que ela chorasse a noite inteira, acordando outras crianças do abrigo. Precisou que todos sofrêssemos pra que ele, o juiz, enxergasse o que já era evidente para todos.

E assim, recebemos a guarda provisória em 18 de maio de 2006. Nove meses depois do dia em que a vimos pela primeira vez. Uma gravidez. Uma nova vida... Ela já era nossa pela lei do amor. Mas faltava a tal lei dos homens dar o veredito final nos concedendo a guarda definitiva. Um documento que faria com que minha filha tivesse o sobrenome da nossa família e uma nova certidão de nascimento.

Foram mais dois anos e meio de espera pra que isso acontecesse. Idas e vindas ao fórum, entrevistas, relatórios, papeladas, burocracias, advogados (do Estado) morosos impedindo a nossa felicidade total. Nossa advogada sofria conosco e não tinha mais cara pra nos explicar que as coisas não têm prazo quando a Justiça dos homens está no meio delas... E dá-lhe espera, expectativa, frustração.

Mas essa semana veio a notícia com um telefonema da doutora Maria Carolina Torres (para nós, a Carol): "O juiz deu o parecer final. Saiu a guarda definitiva. Vocês vão poder fazer a certidão da Tatá".

Então, ontem, dia 27 de novembro, aos 10 anos de idade, nasceu, para a lei dos homens, a minha filha Tailane Morena Dantas Pedro. A mesma menina que já está conosco, certamente, há muitas e muitas vidas. Ela sempre foi nossa. Nós sempre fomos dela.

E essa era a música que cantávamos para nossa pequena quando íamos visitá-la no abrigo.


9 comentários:

Anônimo disse...

Goi e Maurício,
Filhos queridos!
Viva então a lei dos homens que "permitiu" o completo amor já existente!
Beijos na "índia" tão bela e amada, no charmoso baterista e nos dois pais tão carinhosos.
Família é bom demais: reconforta, nos dá força e nos redime! Estou muito feliz por e com vocês.
Mais abraços,
Vô Orlando.

poesia potiguar disse...

Orlando, querido!

Obrigada pelas palavras!! Você não sabe como fico feliz por você ter adotado a gente por tabela. Maurício quer um bem enorme a você, não apenas por tudo o que aprendeu ao seu lado, mas pelo ser humano que você é. E eu acho o máximo poder, agora com seu blog, me sentir um pouco mais próxima desse Orlando tão incrível.

Um beijo grande!

Zilmara Dahn disse...

irmã, parabéns pela força da espera e da luta. eu sei o quanto foi angustiante pra vcs a jornada, mas agora ela está aí e nada mudará o seu destino. Tenho muito orgulho do seu gesto e sei que no fundo tudo fazia sentido porque no seu coração ela sempre foi sua.E eu sei e você sabe que por essência, ela e o Yuri são IDÊNTICOS. Se é que vc me entende...rsrsrs

Ela veio para o lar e os corações certos.E nós a amamos.

Bjo da Tia Zil!!

Andréa disse...

Parabens!! Que alivio, hein?!! Tanta demora, tanto sofrimento. Quase tudo na vida acontece assim, infelizmente. Mas agora eh soh comemorar! :)

Abracos.

poesia potiguar disse...

Querida irmã,

obrigada pelas palavras. seu apoio desde o primeiro dia em que lhe contei sobre ela foi fundamental pra mim... queria que soubesse disso.

Um beijo, love you!

gói

poesia potiguar disse...

Oi, Andréa!

Obrigada! Realmente, agora é hora de festejar muito essa conquista!

beijão!

Cássia disse...

Goi,
Estava com vocês na Favos, carregando meu barrigão de 7 meses do Antônio, no dia 18 de setembro de 2005 e presenciei nos olhos de todos vocês este amor e encantamento que surgiu logo de cara. Acompanhei todo o resto da história a distância. E mesmo assim ainda fico emocionada ao ler seu texto e pensar em como foi sofrida e como é gratificante esta conquista. Vocês se merecem e eu estou aqui, comemorando junto o renascimento da Tatá Pedro, que finalmente tem escrito em documento oficial o nome de seus verdadeiros pais!

Anônimo disse...

Gói e Maurício!

Palavras de um bi-avô a bi-pais: o texto-certidão de nascimento da Tailane ficou racionalmente emocionante. É um desabafo/brado/alvíssaras/lição de moral. Mas ele representa o óbvio: a vitória do bom-senso sobre a burocracia.
E a música perfeitamene adequada que termina é um encaixe perfeito para um desfecho perfeito. Como vovô fresquinho, parabenizo os bi-papais fresquíssimos. Vocês merecem. O ato de vocês é digno de todos os louvores. Pena que a frieza burocrática leve anos para se sensibilizar. Mas... como diz o deitado... ANTES TARDE DO QUE NUNCA.
Super beijos pra família e que esse NATAl seja o corolário da felicidade a quatro. Adoro vocês todos.
Leo

poesia potiguar disse...

Leo,

Leo,querido amigo de todas as horas!

obrigada! obrigada, principalmente, por agüentar minhas lamúrias sobre esse caso ao telefone. Aliás, o que seria de mim sem suas palavras de apoio e incentivo em tudo o que faço na vida?

fique por perto sempre!

um beijo ao vovô em dose dupla!