segunda-feira, julho 07, 2008

There must be an angel...



Os olhos negros me fitando sérios...
Impenetráveis, a me sondar.
Num ambiente cheio de livros,
Onde ele sempre gostou de estar.
Naquela hora, nesse meu sonho,
Éramos nós, num só olhar.
Você um sábio, menino e homem,
Texto cifrado
pra eu decifrar...
Por vezes, triste,
Por vezes, gênio,
Estrela amiga,
Espécie de amor...
E nossos planos,
Nossos enganos?
Todos os discos...
O que restou?
Verbos impressos,
Tão controversos,
O teu auxílio,
Meu editor...

E foi-se o tempo,
Nossos silêncios,
Nossas poesias,
Que o mar levou...
Aprendizagens,
As mil bobagens,
A faculdade:
pra você criticar...
O nosso curso,
As nossas retas,
Rotas incertas:
Pra gente enveredar...
Dissemos muito.
Vivemos pouco.
Faltou um mundo!
Que eu quero te mostrar...
Tantas mudanças,
Tantos progressos,
Tanta alegria...
Mas você não está...
Foi de repente.
Um tiro seco.
Um estampido,
De assalto, a te levar!
Para outro mundo,
Para outro tempo,
Outra fronteira,
Onde você estará?
Há tantos anos,
Muitos invernos,
Venho ocultando
A dor e o pesar...
Da tua ausência,
Marca indelével,
Tão forte e bruta,
Que sempre aqui está...
No velho peito,
Da “Cara amiga”,
Que, você sabe,
Se chama Goimar...

Goimar Dantas
São Paulo
25-05-08




O poema acima, fundamentado em um sonho que tive no final do último mês de maio, é dedicado ao meu grande amigo Rogério dos Santos Prado, que perdeu a vida num assalto, quando contava apenas 20 anos, em 1992... Estudamos juntos no colegial e no primeiro ano da Faculdade de Jornalismo, na cidade de Santos. Eu estava amando o curso e ele – milhões de anos mais evoluído intelectualmente – achava tudo muito chato. Dizia que abandonaria o curso pra fazer Filosofia, disciplina pela qual se apaixonara perdidamente – muito devido à influência positiva das aulas de nosso professor Daniel Leandro Gonzalez.

Rogério foi meu primeiro editor, ainda no colegial, quando decidiu criar um jornal na escola, para o qual eu colaborava. Tenho uma saudade imensa de suas análises profundas sobre os assuntos por vezes considerados os mais banais... Saudade de falar com ele sobre música, cinema e literatura... Saudade de andar com ele de moto pela Avenida da Praia. Saudade de tomar chuva em sua companhia... E, principalmente, de chegar em casa usando a camisa que ele, cavalheiro até a medula, me emprestava para que eu não passasse frio nessas ocasiões chuvosas... Tenho saudade de ir até a sua casa, no Canal 3, para escutar música, fazer trabalhos da escola e, ao final, comer o bolo de nozes incrível que a mãe dele nos servia... Tenho saudade de sua empolgação quando me apresentava um novo disco, um novo filme... Saudade de seu esforço descomunal para me explicar as teorias de Nietzsche e Wittigenstein e, pouco depois, selar a conversa dissertando sobre “(...) a importância do novo disco da Madonna para o cenário pop internacional...” Essas eram nossas maiores diferenças. Nunca dei muita bola pra Filosofia e tampouco pra Madonna. Mas, com o passar do tempo, aprendi, sinceramente e de todo o coração, a respeitar muitíssimo ambas essas senhoras...
Rogério era um cara muito atento, perspicaz, “antenado” – para usar um termo mais atual. Fico imaginando como seria sua vida nessa era pós Internet (até porque antes mesmo dela ele já parecia ter um Google na cabeça...).
O fato é que, ano após ano, desde a sua partida – não sei bem o porquê –, venho tentando esconder de mim mesma a imensa falta que ele me faz... Mas essa saudade sempre explode quando escuto certas canções, quando leio Filosofia, quando entro em uma livraria ou quando vejo alguma entrevista/análise sobre “a importância da Madonna no cenário pop internacional”. Sim, Rogério, você estava certo... Ela é mesmo um “fenômeno”.

Algum tempo depois de ele ter nos deixado de maneira tão abrupta e dolorosa, sua mãe convidou os amigos mais íntimos do filho para um café, com bolo de nozes... E, naquela tarde inesquecível, fez a partilha de todos os discos e livros de Rogério entre nós. Como não poderia deixar de ser, herdei toda a coleção do Eurythimics – dupla musical que nós dois amávamos –, dentre outras coisas.

Tantos anos depois, como ele não está mais aqui para me mostrar o que há de novo, cabe a mim postar neste espaço um vídeo que, estou certa, ele iria gostar. Trata-se de uma nova versão do hit “There must be Angel”, do Eurythimics. Só que na voz doce de uma moça chamada Fernanda Takai.

Querido amigo, saiba, onde estiver que: “No one on earth could fell like this...



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